VAR: a inovação não está na tecnologia, mas sim, no comportamento
VAR: a inovação não está na tecnologia, mas sim, no comportamento
A discussão é infinita e ingrata, pois o foco está onde não deveria. Temos o hábito de reduzir o que chamamos de inovação às questões ou soluções que passam somente pela tecnologia, quando na verdade, trata-se do comportamento, de como percebemos a realidade e, principalmente, nos relacionamos com tudo que nos cerca.
Um erro da arbitragem hoje em dia é muito mais impactante do que antigamente.
Não em relação à paixão do torcedor, mas no que se refere aos investimentos por parte de todos: clubes, patrocinadores, marcas, federações, detentores de direitos de transmissão e claro, do próprio torcedor, que paga cada vez mais caro para vivenciar sua paixão.
E nesse caso, comportamento pode significar tanto as regras do jogo, como as próprias demarcações do campo de futebol que determinam tudo o que acontece dentro das 4 linhas. São as regras e as demarcações do campo que deveriam estar no foco de toda a discussão sobre o VAR, ou melhor, sobre o que ele vem trazendo à tona, como a necessidade da evolução do jogo e a profissionalização dos árbitros, ao invés de focar apenas na tecnologia, comparando as utilizadas no Brasil e na Inglaterra, por exemplo.
Entre novembro de 2016 e julho de 2017 o Futbox publicou em seu Blog dois artigos que ganham força a cada temporada que se inicia, onde sempre temos as insatisfações de técnicos, jogadores, dirigentes e imprensa com os erros de arbitragem, decorrentes da utilização do VAR.
Esses dois artigos abordavam: 10 novas as regras para o futebol, entre elas o próprio VAR, que não tinha esse nome no artigo, pois foi proposto pelo Futbox quase simultâneamente à divulgação do “Video Assistant Referee”, utilizado pela primeira vez em jogos oficiais na Copa da Holanda, na partida entre Ajax e Willem II, em setembro de 2016.
Outras regras estratégicas para a evolução do espetáculo e presentes nesse artigo eram em relação aos empates sem gols, caso o jogo terminasse 0x0. Com isso, ambos os clubes marcariam zero ponto. Um ponto somente para empates com gols, além de 70 minutos para a duração total da partida (35 minutos cada tempo) com o cronômetro parando em casos de faltas, atendimentos e bola “fora de jogo”.
(Mais detalhes sobre todas as 10 novas regras, aqui).
O segundo ponto abordado nesses dois artigos foram as novas demarcações do campo de futebol, deixando o jogo muito mais dinâmico, com mais gols e com bem menos erros de arbitragem. Nada foi alterado em relação às dimensões do campo e do tamanho das traves. Continuam com a padronização atual: 105mx68m (campo) e 7,32mx2,44m (traves dos gols).
As mudanças propostas contemplavam a redução na dimensão da grande área, a eliminação da pequena área (como no futsal) e a criação do setor sem impedimento.
Isso mesmo, criação de um setor sem impedimento que, junto com a proposta para zero ponto em empates em 0x0, proporcionariam muito mais emoção, mais gols e bem menos erros de arbitragem, no campo e na utilização do VAR, além de demandarem novas possibilidades táticas para o jogo.
Esses estudos em relação às novas demarcações do campo foram pautados na relação entre todos os agentes envolvidos: jogadores, árbitro, auxiliares (bandeirinhas), patrocinadores, empresas e claro, torcedores.
(Todo o processo construtivo das novas demarcações do campo de futebol, aqui).
O sucesso de qualquer solução no futebol precisa equilibrar tradição e inovação
O foco de todas as intermináveis discussões sobre o VAR, sejam positivas em relação à sua utilização na Inglaterra ou negativas, como as praticadas no Brasil, precisa migrar de eventuais avanços tecnólogicos, que são necessários, obviamente, para soluções que realmente promovam um avanço no jogo/espetáculo, como a adoção de regras atualizadas com o mundo contemporâneo e que respeitem, ao mesmo tempo, a tradição e o lastro do futebol, além da evolução no ambiente onde essas são aplicadas: o campo de futebol.
Regras atualizadas e novas demarcações do campo são as principais questões, junto com a criação de um novo calendário brasileiro, para a melhoria da arbitragem e do produto “Futebol Brasileiro” como um todo.
E, claro, um profissional com o apito dentro de campo e dois nas laterais com suas bandeirinhas. O amadorismo na arbitragem está fazendo hora extra no futebol.
O Futbox, inclusive, entregou uma proposta à CBF no final de 2021, contemplando o novo calendário brasileiro. Entre outras coisas, a proposta apresentou: 58 datas, mais de 600 clubes com jogos durante todo o ano e com sustentabilidade para todos durante o periodo, nenhuma “Data FIFA” utilizada, valorização das Séries B, C, D e agora, a nova Série E, estaduais enxutos para os grandes clubes, o Campeonato Brasileiro da Série A em reais condições de competir, técnica e financeiramente, com a Europa, o mapeamento eficiente para cada Real ou Dólar investidos num jogador, clube ou competição, a experiência do torcedor em evidência, etc.
(Download da proposta completa referente ao novo Calendário Brasileiro, aqui).
A partir desse cenário com novas possibilidades e propostas com reais condições de implementação, o esporte mais praticado no mundo (se acordo com a FIFA, mais de 265 milhões de pessoas em todo o mundo jogam futebol regularmente) poderia aprimorar sua execução, dentro e fora de campo. O sucesso de qualquer solução no futebol precisa equilibrar tradição e inovação, para que faça sentido, por exemplo, para todos os agentes envolvidos, que possuem desejos e objetivos diversos, além de contribuir, de fato, para tornar o futebol cada vez mais apreciado, praticado e consumido.
Outro ponto importante e complementar para que possamos evoluir o jogo e não somente diminuir os erros de arbitragem, é a realidade contemporânea com suas “pseudo experiências” durante uma partida, que acabam prejudicando muito mais do que contribuindo com tudo que se relaciona ao universo do futebol: apostar em qualquer coisa a qualquer momento durante os 90 minutos, interferências gráficas que atrapalham o entendimento do jogo, pois fragmentam os lances e a movimentação em campo, sem falar no hábito comum entre os jovens em acompanhar tudo ao mesmo tempo, via multi telas.
Esse cenário complexo acaba sugerindo, aos poucos, que o futebol em si, não é o suficiente.
Estamos formando pessoas que não se contentam com o esporte apenas, precisam apostar e ganhar alguma coisa enquanto se relacionam com o futebol.
Um exemplo claro e cristalino dessa “disfunção” acontece quando um torcedor aposta contra o seu próprio time e comemora, por exemplo, um gol sofrido.
No universo das apostas o clube irá perder sempre, pois a cada nova geração de apostadores, o vínculo com os seus torcedores será menor. A “casa” sempre ganha.
Tal deslumbramento com as possibilidades tecnológicas é, de certa foma, normal para o nosso amadurecimento em relação a elas próprias. Entretanto, os profissionais que determinam os rumos do futebol precisam ter uma percepção arrojada e profunda sobre isso, precisam ser extremamente qualificados para gerir todo o ecossistema do futebol.
As pautas de discussão sobre como evoluir o futebol, reduzir os erros de arbitragem, sejam humanos ou do VAR (que também é comandado por humanos), ou como tornar o jogo mais atrativo e com maior audiência, precisa focar a origem dos fatos e não as consequências.
A inovação no futebol está no comportamento, como ele é percebido, interpretado e promovido dentro das 4 linhas, nas arquibancadas e nas transmissões.
A tecnologia é uma ferramenta.
A solução para os erros de arbitragem, por exemplo, e que nunca terá 100% de acertos, passa pela atualização das regras e das demarcações do campo, equilibrando sempre, tradição com inovação.
Montagem de capa: Futbox
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